CEO da Blau Farmacêutica comenta os planos de expansão para o varejo
Após a morte de Alfredo, descobriu-se que ele tinha vários herdeiros de diferentes relacionamentos e a indústria, então, se desmembrou. Seu filho Rodolfo Hahn ficou com a parte brasileira, a Ariston.
Em 2005, com dificuldades financeiras, Rodolfo se viu obrigado a se desfazer do negócio da família. Formado em farmácia, seu filho Marcelo Rodolfo Hahn não só recobrou a indústria do pai poucos anos depois como reconstrói o império de seu avô por meio da Blau, que exporta fármacos para diversos países.
Com foco em medicamentos complexos, feitos para hospitais e clínicas, a Blau (BLAU3) produz antibióticos, antirretrovirais, remédios oncológicos e anestésicos (entre outros) – também fabrica a camisinha Preserv, produto inicial da marca. Hoje, são mais de 8 mil clientes, em um mercado estimado em mais de R$ 7 bilhões.
No Brasil, a companhia tem 27% do mercado no qual está inserida. Estreou na bolsa em 2021, ano que fechou com lucro de R$ 324 milhões. No terceiro trimestre de 2022, lucrou R$ 93,9 milhões, com margem líquida de 26%.
Aqui, Hahn conta como construiu uma companhia com valor de mercado de R$ 4,8 bilhões vendendo o seu carro aos 19 anos e recuperando o legado de família. E mostra os planos de expansão da Blau.
Como surgiu a Blau?
Eu visitava o laboratório do meu pai desde pequeno. Naquela época não existiam as restrições e cuidados que temos hoje para entrar dentro de uma área fabril. As visitas acabaram virando trabalho quando eu era adolescente. E essa experiência foi mais que um excelente aprendizado, ela me despertou o sonho de um dia ter minha própria indústria farmacêutica.
Fui cursar farmácia nos Estados Unidos, enquanto meu irmão mais velho abria um negócio próprio que prosperou muito. Isso despertou ainda mais a vontade de ter minha própria empresa no Brasil. Logo que voltei ao país, comecei a estudar o que poderia ser um bom negócio ligado à indústria farmacêutica.
Pensei em importar IFA (ingrediente farmacêutico ativo), mas para isso era preciso muito dinheiro – eu precisaria ter um estoque com vários IFAs para atender a indústria brasileira. E não contei com a ajuda do meu pai, porque ele queria que eu trabalhasse com ele.
Então, continuei pesquisando. Naquele momento estava tendo uma onda de Aids no mundo e aqui no Brasil só havia um fabricante de preservativos com várias marcas. Foi aí que pensei em importar preservativos. Aos 19 anos, vendi meu carro e investi nessa ideia.
Como as marcas de camisinha da época tinham uma linguagem que beirava o pornográfico, escolhi vender o meu em uma caixa branca com uma maçã vermelha. Foi aí que nasceu a Preserv, em 1987. Comecei importando da Alemanha. E depois, com o crescimento das vendas, comprava da Malásia e da Tailândia.
Eu mesmo visitava os clientes e realizava as vendas. Como o mercado era carente, foi muito fácil a inserção da Preserv. Vendíamos até em supermercados embalagens com 12 unidades. Via-se muita mãe comprando para o filho, dada a quantidade de artistas famosos contaminados.
A operação cresceu tanto que, quatro anos depois da abertura da companhia, eu já conseguia importar medicamentos. E assim a Blau foi se desenvolvendo. Hoje, a Preserv responde por menos de 1% da nossa receita.
Por que a decisão de construir fábricas próprias no Brasil?
O país tinha muitos problemas econômicos, sempre com desvalorização da moeda. Então, você remava, remava, remava e perdia muito dinheiro com essas mudanças cambiais. Foi aí que decidi montar uma indústria. A nossa primeira fábrica foi inaugurada em 1995, em Caucaia do Alto (SP), voltada para a produção de medicamentos oncológicos.
Logo depois, em 1999, foi criada a Anvisa, o que nos favoreceu bastante porque nossas instalações já respeitavam as normas que seriam implementadas. Essa planta é dedicada exclusivamente para produtos oncológicos, mas, naquela época, muitos laboratórios foram obrigados a parar de fabricar tais medicamentos para evitar a contaminação cruzada com outras produções. Você não pode manipular um produto oncológico junto com um produto que não é oncológico por conta dos residuais.
Já em 2005 inauguramos nossa segunda fábrica, em Cotia (SP), dedicada a produtos biológicos, a primeira no Brasil.
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E a fábrica que era de seu pai? Por que comprá-la de volta?
Desde que comecei a Blau, sempre tive uma política de não concorrer com o laboratório do meu pai. Nunca vendi os produtos que ele vendia. Mas ele acabou tendo dificuldades com essa mudanças regulatórias e com a fraca economia do país no fim dos anos 1990, então vendeu a fábrica de antibióticos para terceiros em 2005. Em 2013, conseguimos recuperá-la para aumentar nosso portfólio com antibióticos.
Também compramos um laboratório em Anápolis (GO) e, agora, mais recentemente outro em São Paulo.
Ainda expandimos as unidades antigas e, na de Cotia, passamos a produzir IFA. Investimos nisso desde os anos 2000 e, em 2021, finalmente inauguramos a planta. Foi um sonho realizado.
Como o nosso carro-chefe é a nefrologia [medicamentos que tratam doenças do sistema urinário], produzimos IFA para a fabricação desses fármacos. Somos líderes nesse mercado no Brasil, com cerca de 95% da fabricação de alfaepoetina [remédio que estimula a produção de células vermelhas do sangue, usado por pacientes em hemodiálise].
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Agora, estamos produzindo quatro proteínas para ingressar no mercado de anticorpos monoclonais [utilizados para o tratamento de câncer, entre outras funções]. Somos precursores desse desenvolvimento.
E como está a expansão da Blau fora do Brasil?
Nos últimos dez anos, investimos bastante na expansão geográfica. Compramos nossos distribuidores
na Colômbia, no Uruguai, no Chile, na Argentina, no Peru e no Equador. Também exportamos para Costa Rica, Panamá, Tailândia, Vietnã e Emirados Árabes. Hoje, nós temos mais registros de medicamentos da Blau fora do Brasil do que no Brasil.
Nosso próximo desafio é o México. Queremos ingressar ali para depois ir para o mercado americano.
Nos EUA, já temos uma operação de coleta de plasma – algo que não é regulado no Brasil. Precisamos de plasma para produzir medicamentos como a imunoglobulina, que foi muito utilizada na pandemia contra a Covid-19.
Passamos a fazer a coleta recentemente para garantirmos a qualidade do produto – e para que ele não nos falte.
Nos EUA, paga-se em média US$ 75 por coleta. E, diferentemente da doação de sangue, que só pode ser feita duas vezes ao ano, a de plasma pode ser feita duas vezes por semana. Acaba sendo um bom complemento de renda. Mas aqui no Brasil isso é proibido.
Já estamos abrindo nosso segundo centro de coleta nos EUA e montando o terceiro. A ideia é termos dez por lá, o que vai nos dar a independência em relação a esse insumo. Também estamos investindo no aumento de capacidade produtiva nas nossas plantas atuais e no projeto de Pernambuco.
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O que é este projeto?
A ideia é produzir todos os nossos medicamentos lá em grande escala e com baixo custo operacional e exportar para o mundo todo. A fábrica está muito bem localizada [no Complexo de Suape], a cinco quilômetros do aeroporto e do porto.
Vamos dar início à obra agora no primeiro semestre de 2023, a um custo de construção de R$ 1 bilhão. Ela deve iniciar a produção em 2024.
Como lá temos benefício da Sudene, ou seja, redução de impostos, este é um investimento que se paga. Além de um desconto no ICMS, temos uma redução de 85% no Imposto de Renda.
Hoje, temos cinco fábricas em cinco endereços diferentes. A ideia é produzir tudo em um lugar só, com alta capacidade e baixo custo operacional, de modo que nos permita expandir nossa linha de medicamentos.
O plano é transferir todas as produções para Pernambuco, menos a do IFA, que requer muita pesquisa e inovação – e é difícil levar tantos pesquisadores para lá.
E queremos ampliar nossa presença no mercado. Estamos muito focados em hospitais, que recebem 95% do que fabricamos, então vamos começar a produzir mais medicamentos para o varejo, com remédios de prescrição.
Quais os planos para o varejo?
Estamos investindo na serialização dos medicamentos. Ou seja, o remédio vai ser produzido com um número de série e será possível vendê-lo por unidade, e não apenas em uma caixa com dez, trinta comprimidos.
Também desenvolvemos embalagens unitárias que podem ser preenchidas de acordo com a necessidade exata do paciente. Sem ele ter de comprar mais ou menos do que precisa. É algo que já existe nos EUA e que a Anvisa deve liberar por aqui.
Além do seu pai, que preside o conselho da Blau, existe mais alguém da família na companhia? Há um plano de sucessão?
O meu segundo filho se formou na Inglaterra, veio para a Blau, fez dois anos de trainee e agora está cuidando de uma de nossas unidades. Temos um plano sucessório dentro da organização, mas vai depender dele. Ele terá que conquistar o seu espaço. Sempre deixei claro para os meus filhos que se eles quisessem trabalhar aqui teriam que ter o melhor currículo de todos para não serem chamados de filhinho de papai.
Tenho muito cuidado porque sempre penso a companhia em primeiro lugar e me preocupo com sua perpetuidade. É como se a empresa fosse meu primogênito. E olha que sou pai de cinco filhos. Tenho muito amor pelo negócio e não gostaria de ver isso aqui perdido, como já aconteceu na minha família. E essa foi uma das grandes motivações para abrirmos o capital.